AdC condena Nestlé a coima de 1 milhão de euros por imposição de cláusulas abusivas nos contratos de fornecimento de café
Comunicado nº 9/ 2006
A Autoridade da Concorrência condenou a Nestlé Portugal ao pagamento de uma coima de um milhão de euros por ter dado como provada a violação da legislação da concorrência nos contratos de fornecimento de café a hotéis, restaurantes e cafetarias (denominado canal “Horeca”).
A Autoridade concluiu que diversas cláusulas desses contratos consubstanciam uma prática anti-concorrencial, de carácter vertical
, tendo como objecto e por efeito restringir a concorrência no mercado de fornecimento de café para consumo fora de casa.
A vinculação de hotéis, restaurantes e cafetarias a cláusulas de exclusividade, sem termo certo, para com a Nestlé tem constituído uma barreira a uma maior concorrência. As referidas cláusulas têm sido utilizadas, pelo menos, desde 1999 e foram mantidas em vigor até à conclusão deste processo.
Por isso, a Autoridade decidiu condenar a Nestlé ao pagamento de uma coima de um milhão e euros e obrigar à eliminação das cláusulas contratuais que impliquem uma duração da obrigação de compra exclusiva por período superior a cinco anos.
O mercado de café torrado e torrefacto
A venda de café torrado e torrefacto destina-se sobretudo a dois tipos de consumo: o café consumido no lar e o café consumido fora de casa em hotéis, restaurantes e cafetarias.
O fornecimento a hotéis, restaurantes e cafetarias representa 61,5% do mercado de café torrado e torrefacto em Portugal. Neste mercado, em termos genéricos, 4 empresas dominam cerca de 80% de quota de mercado.
Este é um mercado maduro e estagnado, em que a posição das empresas concorrentes se encontra cristalizada, pelo menos, desde 2000. Este facto dificulta não só a entrada de novos concorrentes, como tem impedido empresas com menor quota de conquistarem novos clientes. Importa salientar que o consumo de café se encontra profundamente enraizado nos hábitos de consumo dos portugueses.
O Caso Concreto
O processo teve origem numa denúncia apresentada à Autoridade da Concorrência. Após a investigação, a Autoridade conclui que a Nestlé vem celebrando, pelo menos desde 1999, contratos de fornecimento de café ao canal Horeca contendo cláusulas restritivas da concorrência, que correspondem a um conjunto de contratos tipo, celebrados em todo o território nacional.
No decurso da investigação ficou demonstrado que a Nestlé impunha aos seus clientes obrigações de não concorrência (compra exclusiva), com duração incerta.
As obrigações de não concorrência, conjugadas com a imposição de compra de quantidades mínimas de café, resultavam na impossibilidade prática, para o cliente, de recorrer a outro fornecedor por um período sem termo certo.
Os contratos celebrados pela Nestlé prevêem que, uma vez decorridos cinco anos de compra exclusiva da marca de café, o contrato seja prolongado sempre que ocliente não tenha adquirido as quantidades mínimas obrigatórias de café, sob pena de se ver obrigado a pagar uma indemnização, dissuasora da denúncia do contrato.
Importa, ainda, salientar, que à luz de legislação comunitária, as cláusulas de não concorrência não podem, em regra, exceder os cinco anos.
Como efeito prático, este tipo de contrato condiciona a liberdade de escolha dos estabelecimentos do canal Horeca em relação aos seus fornecedores de café por largos períodos de tempo, reduzindo a concorrência entre marcas.
A prática objecto do presente processo preenche o n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º18/2003, de 11 de Junho, e não beneficiou do benefício da isenção por categoria para as restrições verticais, abstractamente aplicável
, nem de um balanço económico positivo individual, nos termos do n.º 1 do artigo 5.º da Lei n.º 18/2003, de 11 de Junho.
A Decisão da Autoridade
A Autoridade da Concorrência concluiu que a Nestlé, ao celebrar contratos de fornecimento de café com cláusulas de compra exclusiva, tendo por objecto e efeito restringir de forma sensível a concorrência, violou o n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 18/2003, de 11 de Junho, o que constitui uma contra-ordenação punível nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 43.º do mesmo diploma legal.
Por isso, decidiu condenar a Nestlé ao pagamento de uma coima no valor de € 1.000.000,00 (um milhão de euros), bem como eliminar as cláusulas contratuais que impliquem uma obrigação de compra exclusiva por um período superior a cinco anos ou a renovação para além dos cinco anos sem o consentimento expresso e livre de ambas as partes.
Restrições verticais e prejuízos para o consumidor
Esta é a primeira decisão condenatória da Autoridade da Concorrência por restrição vertical.
Este tipo de prática é proibido e punido pela legislação da concorrência por, ao agravar o custo de aquisição de um bem para os clientes retalhistas, poder ter como efeito potencial o aumento do preço na venda ao público.
Recurso judicial
Da decisão da Autoridade da Concorrência cabe recurso judicial nos termos da lei.