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Autoridade apresenta a consulta pública projecto de Recomendação sobre o Notariado em Portugal

14-09-2006

Autoridade apresenta a consulta pública projecto de Recomendação sobre o Notariado em Portugal

A Autoridade da Concorrência, no uso dos poderes que lhe estão conferidos por Lei, pretende apresentar uma Recomendação ao Governo sobre “medidas de reforma do quadro regulamentar do notariado, com vista à promoção da concorrência nos serviços notariais”.
 
Nesse contexto, elaborou um Projecto de Recomendação, que vem colocar em consulta pública, com o objectivo de recolher contributos de eventuais interessados, com vista à elaboração final da Recomendação. Nos trabalhos preparatórios, a Autoridade ouviu os principais intervenientes no sector, nomeadamente a Ordem dos Notários, os Conservadores de Registo e outros profissionais e entidades do sector.
 
I. Enquadramento
 
No exercício das suas competências, e em cooperação estreita com a Comissão Europeia, a Autoridade tem vindo a acompanhar a concorrência nas profissões liberais. Actualmente, tanto a nível comunitário como internacional, desenvolvem-se estudos aprofundados sobre a regulamentação das profissões liberais e dos seus efeitos na concorrência.
 
Os trabalhos da CE têm procurado determinar se as actuais regulamentações sobre as profissões liberais são compatíveis com o Direito da Concorrência. Grande parte dos estudos efectuados têm concluído que as regras clássicas nestas áreas têm como efeito limitar a concorrência. Várias decisões da Comissão, corroboradas pelo Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, atestam essa conclusão.
 
Este tema tem, também, sido objecto de análises da OCDE e da OMC.
 
II. O caso português
 
Tendo presente a decisão governamental de, em 2004, pôr fim ao sistema público de notariado, a Autoridade da Concorrência entende que é importante promover, doravante, uma progressiva liberalização do mercado de prestação de serviços.
 
No quadro actual, ao lado dos notários privados, mantêm-se os serviços dos registos na esfera pública, dirigidos, orientados e coordenados pela Direcção Geral dos Registos e Notariado. Acresce que existe a possibilidade de outras entidades, nomeadamente advogados e solicitadores, praticarem, em concorrência com os notários, actos da mesma natureza e sem estarem sujeitos aos mesmos limites de acesso e exercício das respectivas profissões, bem como aos mesmos preçários.
 
O modelo de notariado privado em Portugal dá apenas os primeiros passos. Por isso, é oportuno avaliar as medidas de carácter regulamentar que se revelam restritivas da concorrência, de forma injustificada ou desproporcional. Esta avaliação é necessária para assegurar a sustentabilidade dos notários privados, mediante o conhecimento antecipado das regras que afectam o exercício da profissão. Uma maior transparência permite também garantir uma melhor protecção dos interesses dos consumidores.
 
III. Síntese das medidas propostas
 
No Projecto de Recomendação, a Autoridade considera que o notariado deve ficar sujeito ao controlo justificado quanto ao acesso e exercício da profissão, nomeadamente a normas técnicas e deontológicas que garantam a qualidade do serviço. Porém, foram identificadas regras que, sendo injustificadas ou desproporcionadas, constituem restrições à concorrência.
 
Assim, a Autoridade vem recomendar:
 
  1. Eliminação do princípio do numerus clausus (1): esta norma, que impõe um número máximo de profissionais com acesso à profissão, reduz o número de notários, contribui para o aumento dos preços que são fixados livremente, reduz a escolha dos consumidores em termos de oferta e contribui, ainda, para a criação de monopólios locais.
  2. Eliminação da competência territorial: o notário deve poder exercer a sua actividade livremente, independentemente da área do município em que está instalado o respectivo cartório, a exemplo do que sucede com outros profissionais liberais, como os advogados ou os solicitadores.
  3. Eliminação do licenciamento dos cartórios notariais: a eliminação do numerus clausus e do limite territorial conduzem à inutilidade de concessão de licenças para abertura de cartório notarial, uma vez que a entrada no mercado seria feita de forma livre, sem o escrutínio da abertura de concurso público feito em função das vagas existentes. Há, contudo, que salvaguardar o interesse público pela garantia de uma cobertura geográfica adequada.
  4. Fim da proibição da colaboração entre notários e da possibilidade de o mesmo profissional gerir mais do que um cartório notarial: a medida proposta pretende criar condições para uma organização mais racional e eficiente da actividade notarial.
  5. Alteração das regras respeitantes à publicidade: a permissão da publicidade, com critérios específicos, à semelhança do que aconteceu com os advogados, fomenta a concorrência entre notários pela qualidade e pelo preço, e favorece os consumidores porque diminui a assimetria de informação, beneficiando também a economia e a sociedade em geral.
  6. Eliminação das regras respeitantes à retribuição do notário: para um conjuntos de actos notariais existe, fixada por lei, uma tabela de preços que impede a concorrência entre notários, pela via do preço. A Autoridade recomenda a eliminação progressiva dessa tabela, de forma conjugada com a eliminação do numerus clausus.
  7. Eliminação do valor máximo imposto a outras entidades autorizadas a fazer reconhecimentos e termos de autenticação e tradução documentos(2): para este conjuntos de actos, que podem também ser praticados por câmaras de comércio e indústria, advogados e solicitadores, existe, fixada por lei, uma outra tabela de preços máximos, com valores situados abaixo dos preços impostos aos notários. Esta medida discrimina negativamente os notários, impedindo-os de concorrer via preço com aquelas entidades na prestação do mesmo serviço. A Autoridade recomenda a eliminação desta tabela.
  8. Eliminação/Revisão do Fundo de Compensação: a existência de um Fundo de Compensação(3) é incompatível com a liberalização pretendida para o sector do notariado. Como profissional liberal, qualquer notário deve assumir o risco económico inerente ao exercício da sua actividade. Contudo, e sempre que subsistam cartórios deficitários cuja existência constitua uma necessidade comprovada de serviço público, recomenda-se a contratualização de uma obrigação de serviço público, a ser atribuída mediante concurso.
 
IV. Calendário proposto
 
A Autoridade propõe que a concretização das medidas preconizadas seja feita de forma faseada, com base no seguinte calendário: 

 

Período Duração​ ​Medidas

1ª Fase - Transição​


4 anos​

 
  • Aumento do número de notários actualmente previsto no Estatuto do Notariado;
  • Eliminação da competência territorial, passando o notário a poder exercer a respectiva competência, por regra e não somente a título excepcional, em mais do que uma circunscrição territorial;
  • Substituição dos preços fixos por preços máximos, sendo essa fixação orientada para os custos;
  • Permitir a publicidade da actividade dos notários além da mera divulgação informativa actualmente consentida;
  • Admitir a associação entre notários bem como a criação de mais de um cartório notarial por profissional;
  • Revogação do artigo n.º 5 do artigo 38.º do Decreto-Lei n.º76-A/2006, de29 de Março;
  • Criação de uma Comissão de Acompanhamento, com funções de orientação da transição do modelo regulação vigente para o regime de mercado.
2ª Fase - Liberalização com limitação de honorários​ 1 ano​
  • Eliminação total do numerus clausus
3ª Fase - Modelo de mercado​ ​n.a.
  • Eliminação da tabela de honorários e encargos notariais
  • Eliminação do Fundo de Compensação​

 

V. Informação aos interessados

Os interessados podem dirigir as observações, até 26 de Outubro de 2006, para os seguintes endereços, por via postal ou correio electrónico para:

Autoridade da Concorrência
Rua Laura Alves, n.º 4 - 7.º andar
1050-138 Lisboa

adc@autoridadedaconcorrencia.pt
 
Este comunicado não dispensa a leitura do texto integral do Projecto de Recomendação que contém a evolução história da profissão de notário, a descrição detalhada do actual quadro legal e regulamentar e uma fundamentação mais pormenorizada das medidas agora propostas. O Projecto de Recomendação está disponível para consulta no site da Autoridade em www.concorrencia.pt.

(Comunicado nº 23/2006)